As condições atuais do Brasil e do mundo demandam-nos intensa solidariedade. A quantidade de desempregados, trabalhadores informais e famílias em condições de precariedade e fome neste país, é altíssima. A solidariedade é fundamental, sobretudo neste contexto. Por coerência com os valores cristãos que permeiam nossa cultura, ela é imprescindível. Conforme o Evangelho de Mateus 25,31-46, Cristo a apresenta como critério de salvação, referindo-se ao “juízo final”.
Esse “juízo” se realiza na história, no momento presente, que é o último de nossa vida, pois não temos garantia de poder estar vivos nos minutos seguintes. As nações reunidas diante de Cristo indicam o conjunto da sociedade, em juízo. Aos que o acolheram nos sofredores, ele os chama de benditos e concede-lhes seu Reino. Trata-se de um julgamento sobre nosso modo coletivo de vida, que coloca em questão nossos relacionamentos e nosso modelo de sociedade.
A seguinte interpretação que ouvi de membros da Juventude Operária Católica (JOC) sobre o “juízo final”, no contexto de vida da juventude trabalhadora, é aqui significativa: “As nações serão reunidas diante de Cristo: brasileiros, japoneses, franceses, sul-africanos, americanos, enfim, todos, cristãos e não cristãos, de todas as classes sociais. Ele dirá aos que tiverem sido solidários: venham benditos de meu Pai, recebam em herança o Reino que lhes foi preparado, porque:
Eu estava cego, mudo, paralisado e vocês me acolheram e me ajudaram, possibilitando-me um novo destino. Então, os justos, admirados, dirão: Quando o vimos assim e o socorremos? Ele lhes responderá: eu estava cego nos milhões de jovens trabalhadores do mundo, sem enxergar a realidade da sociedade, sem consciência de meus direitos, sem oportunidades, alienado, deprimido, sem encantamento com a vida e sem coragem até mesmo para me expressar.
Eu estava sofrendo nos milhões de jovens trabalhadores desempregados, excluídos e discriminados do Brasil, da Nigéria, do Paquistão, e vocês me ajudaram a conseguir trabalho, defender minha dignidade e continuar minha formação. Eu estava faminto nos milhões de jovens africanos, haitianos e indianos. Eu tentava, enfim, sobreviverem muitos países, com um salário de miséria, e vocês se organizaram comigo para conquistar melhores condições de vida.
Cada vez que vocês lutaram para romper esses mecanismos de morte e defenderam a vida dos jovens trabalhadores e trabalhadoras do Brasil e do mundo, foi a mim que vocês acolheram, a mim vocês serviram, foi comigo que vocês se solidarizaram.” Essa forma de Jesus se apresentar no “juízo final” nos faz compreender a íntima relação entre o amor a Deus e ao próximo que sofre, bem como a íntima relação entre sociedade justa, solidária e fraterna, e o Reino de Deus.
Legitimar formas injustas de vida em sociedade é desprezar o Reino de Deus. Como, então, tornar realidade e expandir esse Reino, especialmente neste tempo de direitos sabotados? Jesus aponta o caminho: “O tempo já se cumpriu, e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e acreditem no Evangelho” (Mc 1,15). Só participará em seu Reino quem coexistir de modo solidário. Se assim não vivemos, convertamo-nos! Se assim o Brasil e o mundo não são, transformemo-los!